Programa Mudanças Climáticas

Projeto FAPESP analisa incentivos e barreiras legais para a implementação da NDC brasileira

Projeto FAPESP analisa incentivos e barreiras legais para a implementação da NDC brasileira

Pesquisa avaliou os eixos de energia e adaptação às mudanças climáticas

Por Cristiane Bergamini

O ano de 2020 marcou os cinco anos do Acordo de Paris, momento também de revisar as metas assumidas pelos 196 países que integram o Acordo das Contribuições Nacionalmente Determinadas – CND (ou NDC sigla em inglês) para limitar o aumento médio de temperatura global a 2ºC em comparação aos níveis pré-industriais. Em 2015, ocasião da reunião da Conferência das Partes, o Brasil se comprometeu a reduzir as suas emissões em 37% até 2025, em relação aos níveis emitidos em 2005, e, adicionalmente, em 43% até 2030.

Para atingir essa meta, importantes ações foram estabelecidas, como aumentar, até 2030, em 45% o uso de fontes alternativas de energia na matriz energética brasileira; incrementar em 18% a participação dos biocombustíveis; promover o uso de tecnologias limpas nas indústrias; melhorar a infraestrutura dos transportes, restaurar e reflorestar até 12 milhões de hectares e, principalmente, zerar o desmatamento ilegal na Amazônia.

Ainda que se tenha discutido, à época, se as ações propostas eram ou não suficientemente ambiciosas, sua realização exige a implementação de políticas coerentes e, também, a transposição de diversas barreiras, inclusive as de ordem jurídica. Assim, para compreender como essas normas e os seus instrumentos podem se constituir em incentivos e barreiras para o cumprimento das metas do Brasil, foi desenvolvido o projeto “Incentivos e Barreiras Legais para a Implementação da NDC Brasileira”, integrado ao Programa Mudanças Climáticas FAPESP, coordenado pela Professora Ana Maria de Oliveira Nusdeo, da Faculdade de Direito da USP. Vale destacar que as normas legais aqui descritas podem ser entendidas como as leis, normas regulamentares e políticas relacionadas à proteção ambiental, às mudanças climáticas e à regulação de setores envolvidos.

De acordo com a Professora Ana Maria, o projeto analisa a necessidade de melhor desenvolvimento/equação dos arranjos normativos e de governança para que as metas brasileiras definidas em sua CND sejam atingidas nas áreas de mudança do uso da terra, energia e adaptação, buscando entender quais desses arranjos e aspectos de governança apresentam-se como elementos de barreira ou estímulo para se atingir as metas estipuladas na CND.

A metodologia adotada para a execução do trabalho teve uma abordagem qualitativa e envolveu estudos de casos nos temas escolhidos para o projeto (energia e adaptação), análises de normas e documentos (relatórios oficiais, inventários), de artigos e trabalhos publicados nos temas e questões analisadas e entrevistas com representantes do mercado, governo, academia e ONGs, sendo 13 entrevistas com atores envolvidos na área de adaptação e 6 em energia. “Devido a todas essas questões mais complexas de entrevistas e compilações, análises de diversos instrumentos jurídicos e documentos, o projeto, que levou dois anos para ser executado, envolveu uma equipe composta por um estagiário de pesquisa, cinco alunos de pós-graduação e cerca de 20 alunos de graduação em diferentes momentos, informa a Professora.

No eixo da energia, o objetivo foi delimitado de forma a entender como as políticas para a expansão das fontes renováveis, além da hídrica, foram formuladas, quais instrumentos de política utilizados e sob quais regras. Dentro da metodologia qualitativa proposta, buscou-se compreender a interação da legislação com outras variáveis (econômicas, de economia política, etc.).

“O projeto procurou também identificar como os impactos sociais e ambientais dos modais são encaminhados pelo sistema Jurídico. As entrevistas e análises abordaram o tema sob diferentes perspectivas, como a ambiental; dos instrumentos de regulação jurídica; econômicos e sociais para entender os incentivos e barreiras para o cumprimento da CND brasileira; e como as normas jurídicas e seus instrumentos se apresentam nesse contexto”, explica a Coordenadora do Projeto.

Já no tema sobre adaptação, a ação proposta pela CND consiste na implantação de um Plano Nacional de Adaptação que contempla onze frentes de trabalho. Por isso, a análise das barreiras e incentivos para sua implementação exigiu delimitações específicas. “Devido à necessidade dessas especificidades, optamos por trabalhar na análise dos desafios relativos à gestão do risco de desastres nas estratégias de adaptação às mudanças climáticas nas cidades e como os instrumentos jurídicos e políticas públicas respondem à essas problemáticas”, explica Ana Maria.

A partir daí a delimitação focou nos aspectos da abordagem dos riscos, da vulnerabilidade e resiliência, de enfoques preventivos e reativos para o enfrentamento de desastres; da articulação da prevenção a desastres e adaptação às normas do direito ambiental e à governança dessas políticas, incluindo a experiência de participação social em órgãos colegiados na política. Foram, então, elaboradas seis perguntas-chaves para uma pesquisa que, pela sua amplitude, adotou como estratégia especificar uma única localidade para um estudo de caso: a cidade de São Paulo. A escolha por São Paulo foi motivada por ser considerada uma das primeiras cidades a contar com uma Política Municipal de Mudanças Climáticas e também por ser uma das localidades com maiores recursos para sua implementação. A pesquisa buscou compreender como vem sendo implementada a política municipal de adaptação, estabelecida a partir da Lei 14.933/2009, e a prevenção e resposta a desastres na cidade.

“Podemos dizer que o grande desafio neste projeto foi entender os fatos e observar a disputa das narrativas, pois analisamos temas de grande complexidade envolvendo as questões ambientais na esfera política e jurídica”, analisa Ana Maria.

Finalizada em 2020, a pesquisa propõe ações que possam contribuir para o enfrentamento das barreiras legais de implementação da CND brasileira, com apontamentos sobre quais regras legais devem ser alteradas ou ter sua implementação reforçada.

Entre as sugestões propostas no projeto estão a alteração da Lei da Política Nacional sobre Mudança do Clima, para adequá-la à CND e às ações que propõe para o atingimento das reduções de emissão propostas, como as relativas ao setor de energia e à implementação do Plano Nacional de Adaptação; a criação de uma Autoridade Climática Nacional para promover a articulação entre a política climática e as setoriais, como a energética, florestal e de adaptação, o aumento do protagonismo e transparência da agenda e das atas do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima – CIM e inclusão, neste Comitê, de membros da Sociedade Civil; comunidade científico-acadêmica e representantes de governos subnacionais; a inserção de norma proibitiva a procedimento simplificado de licenciamento de obras e atividades que resultem em significativo impacto sobre as emissões, e a criação de um órgão anticrise, vinculado à Casa Civil ou à autoridade climática nacional, responsável pela coordenação de ações de resposta a desastres, entre outras proposições.

Para saber mais sobre o projeto acesse AQUI!