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Novo grupo de trabalho do GRC tem a missão de facilitar a cooperação multilateral na ciência English version

Primeira reunião foi realizada esta semana em Haia, nos Países Baixos, durante a Reunião Anual do Global Research Council


Karina Toledo, de Haia | Agência FAPESP – Produzir o conhecimento necessário para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e lidar com demais desafios complexos do mundo atual é uma tarefa que requer cooperação multilateral. Mas isso não é algo trivial. Se em um mundo globalizado e digital o conhecimento científico cruza facilmente as fronteiras nacionais, o mesmo não ocorre com os recursos públicos que financiam a ciência.

Para encontrar mecanismos que possibilitem a colaboração entre cientistas de diversos países, o Global Research Council (GRC) – entidade que reúne as principais agências de fomento público do mundo – criou o Grupo de Trabalho sobre Engajamento Multilateral, que reuniu-se pela primeira vez nesta quinta-feira (01/06) em Haia, nos Países Baixos.

“O GRC foi idealizado como uma plataforma para o compartilhamento de boas práticas e para o networking entre os líderes das agências de fomento. E isso é bem importante, pois, quando acordamos uma série de princípios, fica mais fácil lançar uma chamada de propostas conjunta, por exemplo. Ainda assim, havia entre os membros a sensação de que era preciso ir além, fazer algo mais amplo do que acordos bilaterais. Mas ninguém sabe ao certo como fazer. Por isso foi criado este grupo”, conta Euclides de Mesquita Neto, membro da Coordenação Adjunta para Programas Especiais e Colaborações em Pesquisa da FAPESP e secretário-executivo do GRC.

A iniciativa começou a ser articulada há cerca de dois anos por representantes da FAPESP e de outras três agências – da Japan Science and Technology Agency (JST), da Research Council of Norway (RCN) e da German Research Foundation (DFG) –, e foi oficialmente aprovada pelo Conselho Administrativo (Governing Board) do GRC em março de 2023. A primeira missão do grupo de trabalho será mapear mecanismos de financiamento que já existem em nível global. Em seguida, avaliar que tipo de oportunidade de engajamento multilateral o GRC poderia promover que já não é oferecido por outras entidades internacionais. “E por último temos de descobrir como se implementa isso”, diz Mesquita Neto à Agência FAPESP.

O diretor de Assuntos Internacionais da DFG, Marcus Wilms, explica que barreiras legais impedem o dinheiro usado no fomento à pesquisa de cruzar as fronteiras nacionais.

“Colaborações bilaterais [nas quais cada país financia seus próprios pesquisadores em projetos colaborativos] têm sido uma forma de lidar com esse problema. Mas a coisa se torna muito mais complicada quando há muitos parceiros envolvidos.”

Uma das principais dificuldades, segundo Wilms, é gerenciar as diferentes expectativas que as entidades têm em relação aos resultados de um projeto de pesquisa.

“Agências como a DFG buscam impacto em termos de conhecimento. Acreditamos dele derivam os outros impactos [social e econômico, por exemplo]. Mas há outras organizações cujas atividades devem necessariamente estar atreladas às prioridades nacionais, são muito mission-oriented [buscam cumprir um objetivo específico]. Então a ideia do grupo de trabalho é criar novos mecanismos para facilitar toda essa articulação”, explica.

Pense globalmente, aja localmente

A importância das instituições internacionais e das agências de fomento na promoção de uma ciência sustentável, do desenvolvimento e da inovação foi o tema do último painel realizado no âmbito da Reunião Anual do GRC. A sessão começou com uma palestra de Salvatore Aricò, que apresentou o trabalho desenvolvido pelo International Science Council (ISC). A entidade trabalha para catalisar e reunir conhecimento científico relacionado a questões de grande interesse da ciência e da sociedade.

“Creio que esta seja a maior plataforma para a ciência. Trata-se de conectar os esforços nacionais em nível global”, disse.

Marc Schiltz contou que a Science Europe – associação que reúne tanto agências de fomento quanto instituições de pesquisa – vem há vários anos buscando desenvolver mecanismos simples pelos quais os financiadores possam encorajar colaborações transnacionais e transfronteiriças, como ter propostas apenas avaliadas por uma única agência, embora todas as envolvidas contribuírem para o financiamento.

Também participou do debate Thelma Krug, vice-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) das Nações Unidas e membro do Conselho Superior da FAPESP. Ela destacou em sua fala a necessidade de fortalecer a cooperação científica entre o Norte Global e o Sul Global.

“No IPCC analisamos a literatura científica produzida no mundo todo e vemos grandes lacunas de conhecimento no Sul Global. Vou dar um exemplo: uma das tecnologias que vêm sendo estudadas para mitigar os efeitos da mudança climática é a modificação da radiação solar [geoengenharia solar]. O IPCC apontou potenciais riscos para a saúde humana, a camada de ozônio e ao ecossistema como um todo, mas esses estudos estão sendo desenvolvidos e sem a participação de países do Sul, que serão amplamente impactados se essa tecnologia for implementada em escala global. Financiadores de pesquisa precisam ter em mente que é necessário um pouco mais de justiça nesse sentido”, afirmou.

Na avaliação de Krug, as agências de fomento poderiam ajudar a reduzir essas lacunas de conhecimento por meio da capacitação de grupos de pesquisa locais.

Esse tem sido um dos trabalhos desenvolvidos pelo International Development Research Centre (IDRC), contou Julie Shouldice, presidente da entidade. Além de oferecer financiamento para projetos, o IDRC fomenta iniciativas do tipo think tank em 20 países com o objetivo de fortalecer o sistema de ciência local.

“Porque, em última análise, a visão é que as pessoas que estão mais próximas dos desafios estão mais aptas a resolvê-los”, afirmou.

Yaya Sangare, secretario-executivo do Programme d’Appui Stratégique à la Recherche Scientifique (PASRES), uma das principais entidade de apoio à pesquisa da Costa do Marfim, também destacou em sua fala a necessidade de instituições internacionais envolverem atores locais. “Muitas vezes chegam com soluções elaboradas fora da África e sem a [participação da] África. E muitas vezes não são nem recebidos”, comentou.

“Ouvimos ao longo desta reunião que é preciso pensar globalmente, mas agir localmente e que entender os problemas locais é fundamental para fornecer soluções eficazes. Isso requer parcerias equitativas e uma compreensão profunda dos problemas para que soluções efetivas e factíveis possam ser encontradas localmente. E este é realmente um problema multiescala extraordinário. Você pode pensar sobre isso no contexto do Norte e Sul Global, mas também entre as comunidades individuais em cada um dos países”, avaliou Ottoline Leyser, diretora-executiva da UK Research and Innovation (UKRI).

Para mais informações sobre a Reunião Anual do GRC acesse: https://fapesp.br/grc23.